Participe da consulta regional REA!
Categorias: Cátedra Unicamp
Abaixo você encontrará o texto que subsidiará as discussões regionais em preparação para o II Congresso Global REA da UNESCO, que acontecerá em setembro de 2017 na Eslovênia. O evento regional das Américas acontecerá no Brasil em abril, no entanto, por definição dos organizadores, é um evento fechado.
Buscando a participação e opinião de um público amplo no debate sobre as prioridades e desafios relacionados a Recursos Educacionais Abertos, disponibilizamos aqui o documento traduzido para o português para comentários (há versão em espanhol disponível).
Para comentar basta clicar no símbolo + ao lado do parágrafo de interesse. Compilaremos os resultados no dia 25 de março. Alternativamente, adicione um comentário: quais são os maiores desafios para implementação de REA nas Américas? Fique a vontade para focar em algum país/contexto/escopo específico.
O texto abaixo está disponível para impressão em (PDF) e (ODG).
Agradecemos a generosa contribuição de Robert Fischer na diagramação do documento.
Introdução
O Congresso Mundial de Recursos Educacionais Abertos (2012), organizado pelo Commonwealth of Learning (COL) e pela UNESCO, com o apoio generoso da The William and Flora Hewlett Foundation (UNESCO, 2012a), reuniu mais de 400 participantes de 70 países. O Congresso teve como resultado a adoção da Declaração REA de Paris (Anexo A) que incentiva governos a promover o uso de licenças abertas para material educacional criado com financiamento público.
Antes do Congresso, o COL e a UNESCO organizaram seis fóruns nas principais regiões do mundo para informar governos e líderes educacionais sobre o potencial dos REA e para engajá-los na redação da Declaração REA de Paris. O tema das consultas regionais foi “angariando apoio governamental para REA em nível internacional”. Os seis fóruns regionais foram realizados em Barbados, África do Sul, Brasil, Reino Unido, Tailândia e Oman (UNESCO, 2016b). A avaliação feita em 2015 pela The William and Flora Hewlett Foundation sobre as iniciativas em torno dos REA pela UNESCO e COL, reconhece que, desde Congresso Mundial de REA, as atividades de ambas as organizações estavam alinhadas e as forças de cada uma se complementaram (ORS Impact, 2015). COL e UNESCO trabalham em proximidade e cooperam na área de REA com relação a promoção, formação e elaboração de políticas públicas em torno da Declaração REA de Paris.
O Congresso Mundial de REA teve como enfoque assegurar apoio governamental para REA. O II Congresso Mundial de REA tem como objetivo facilitar a transição do comprometimento às ações. A comunidade global identificará estratégias para aproveitar o potencial dos REA e alcançar uma educação equitativa e de qualidade ao longo da vida, até 2030.
Seguindo a proposta do Governo da Eslovênia para o 199o encontro do Conselho Executivo da UNESCO, o II Congresso Mundial de REA está marcado para ser realizado em Liubliana entre os dias 18 e 20 de setembro de 2017, sob organização do Governo da Eslovênia. Esse ano marcará cinco anos do I Congresso Mundial de REA. Durante o ano que precede o II Congresso, o COL, em parceria com a UNESCO e o Governo da Eslovênia conduzirão questionários para representantes de governo e atores-chave de todo o mundo, e farão consultas regionais para:
- identificar o status atual das recomendações feitas pelo Congresso Mundial de REA com os atores-chave, nominalmente: governos, legisladores, a comunidade REA e a comunidade educacional de maneira abrangente;
- iniciar debates em torno dos desafios identificados relativos a integração dos REA, como foi destacado no informe da reunião de Mapeamento de Implementação (roadmap) REA (UNESCO, Paris 2016);
- angariar interesse entre atores-chave sobre o objetivo do II Congresso Mundial de REA e fazer recomendações que possam ser levadas em consideração; e
- encorajar um maior número de governos a se comprometer com a adoção de licenças livres para o material educacional criado com recursos públicos.
O tema para as consultas regionais é “REA para uma educação inclusiva, equitativa e de qualidade: do compromisso à ação”, e as reuniões serão realizadas, conforme a tabela a seguir:
Contexto
O termo “recursos educacionais abertos” (REA) foi adotado em um Fórum da UNESCO sobre o Impacto dos Cursos Abertos no ano de 2002, para descrever o fenômeno de compartilhamento aberto de recursos educacionais. Em geral, REA incluem: anotações de palestras, slides, planos de aula, livros didáticos, material distribuído aos alunos, videos, tutoriais online, podcasts, diagramas, cursos completos e qualquer outro material designado para ensino e aprendizagem.
Em 2012, o Congresso Mundial de REA reuniu representantes de governo bem como especialistas em educação e REA e enfatizou o uso de REA como meio para providenciar acesso equitativo ao conhecimento. Foram apresentadas iniciativas e políticas inovadoras que demonstram o potencial dos REA para aumentar o acesso a uma educação inclusiva e equitativa e de qualidade. REA têm o potencial de trazer contribuições significativas para o ODS 4, que propõe assegurar “educação inclusiva, equitativa e de qualidade para promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos”, com os seus pilares fundamentais de acesso, equidade e inclusão. O Congresso Mundial de REA (UNESCO, 2012a) definiu REA como:
REA são qualquer recurso educacional que pode ser acessado, copiado, reutilizado, adaptado e compartilhado livremente e que está disponível com uma licença aberta ou está no domínio publico para uso sem taxas de licenciamento.
Desde 2012, o enfoque tem sido na implementação da Declaração REA de Paris, com vistas a difundir REA no setor educacional de todo o mundo. A agenda Educação 2030 (UNESCO, 2015a) reafirma o comprometimento político anterior de buscar facilitar o diálogo sobre políticas, a troca de conhecimentos, a definição de normas e cooperação global e regional. Conforme estabelecido pela Declaração de Qindao, “REA oferecem, aos envolvidos com educação, oportunidades para que possam melhorar a qualidade e expandir o acesso à livros didáticos e outras formas de conteúdo educacional, promovendo o uso inovador do conteúdo e fomentando a criação de conhecimento (UNESCO, 2015b). A Declaração de Qindao propõe estratégias setoriais e programas de formação para que se possa expandir o acesso à oportunidades de aprendizagem ao longo da vida.
Práticas de integração dos REA
Questões-chave
A integração de REA por parte dos grupos do setor educativo de todo o mundo depende de fatores chave relacionados a: (i) reconhecimento dos benefícios dos REA, (ii) mobilização do setor educacional, (iii) confrontar questões financeiras e (iv) atingir clareza no significado de “aberto” no contexto dos REA.
Benefícios
REA oferecem o potencial de providenciar acesso mais equitativo ao conhecimento e às oportunidades de aprendizagem ao fazer com que recursos educacionais de qualidade e de custo acessível estejam largamente disponíveis em um momento quando sistemas educacionais ao redor do mundo estão encarando desafios cada vez maiores. Por causa do rápido crescimento no número de matrículas, o aumento limitado ou nulo de recursos financeiros disponíveis para a educação e o avanço contínuo para facilitar o uso de infraestrutura de tecnologias da informação e comunicação (TIC), é cada vez mais importante que sistemas educacionais apoiem, de maneira deliberada e organizada: o desenvolvimento de materiais de ensino e aprendizagem de qualidade, currículos escolares, planos e programas de estudos; planejamento de contato efetivo com os alunos; o design de avaliações efetivas; e a identificação de meios para satisfazer as necessidades de um grupo diversificado de alunos. Essas atividades buscam a melhoria do ambiente de ensino e aprendizagem e, ao mesmo tempo, reduzem custos a partir do incentivo ao uso crescente de aprendizagem baseada em recursos. REA auxiliam na gestão desse investimento e das questões relativas aos direitos de autor, de modo a cobrir os custos de melhorias contínuas e efetivas em torno dos processos de ensino e aprendizagem, seja em contextos formais ou não-formais.
O papel dos grupos do setor educacional
Os governos estão interessados em assegurar que os investimentos públicos em educação contribuam de maneira significativa e efetiva para o desenvolvimento socioeconômico. A Declaração REA de Paris incentiva governos a utilizar licenças livres para recursos educacionais financiados com recursos públicos. Compartilhar esse material educacional pode contribuir consideravelmente para melhorar a qualidade e acesso a educação em todo o sistema educacional nacional. Isso pode ser feito permitindo que REA sejam mais acessíveis a todos os profissionais da educação, e não somente os que recebem verbas públicas (UNESCO & Commonwealth of Learning, 2011).
Os governos — que tem papel chave na elaboração de políticas e financiamento de instituições educacionais, e como as políticas de financiamento educacional também indicam prioridades-chave — estão em uma posição ideal para encorajar ou exigir que instituições publiquem seus recursos como REA e utilizem licenças livres para os materiais financiados com verbas públicas. Governos também podem usar regimes de licenciamento aberto para fazer bom uso de recursos públicos, facilitando o amplo reuso desses investimentos com custos adicionais mínimos.
Os REA são realmente “grátis”?
Um dos benefícios-chave de conteúdos abertos é que eles são “grátis” para o usuário final (ou seja, não custam nada para baixar, deixando de lado os custos de acesso). No entanto, REA têm custos relacionados ao desenvolvimento, adaptação e/ou recombinação do material. Historicamente, muitos desses custos têm sido financiados por doadores. O financiamento por parte de doadores tem sido um componente essencial para fomentar práticas em torno dos REA; para que essas possam se tornar sustentáveis e realmente efetivadas, os governos e as instituições educacionais precisam investir sistematicamente na elaboração e aquisição de programas, cursos e materiais. Os custos incluem salários para a equipe que desenvolve currículo e recursos, adaptam REA existentes e lidam com licenciamento e direitos autorais (quando os recursos não tem uma licença livre). Também incluem custos associados à infraestrutura de TIC (para autoria e compartilhamento de conteúdos), banda-larga, custos para oficinas e reuniões para equipe de desenvolvedores dentre outros.
O termo “aberto” em REA
O termo “aberto” é utilizado de maneira livre. Com o ganho de popularidade, está sendo utilizado em diferentes setores, como governo aberto, arquiteturas abertas, sociedade aberta, acesso aberto a recursos educacionais e software de código aberto (Weller, 2011).
Em muitos casos, discussões atuais sobre reformas educacionais, particularmente no ensino superior, têm migrado de REA para cursos massivos abertos online (MOOCs, em inglês). Ambos estão relacionados a políticas de educação aberta e reforma, mas existem diferenças. Em particular, a maioria dos MOOCs só permite uso por exceções e limitações (fair use) ou tenham direitos especificados em suas políticas de
licenciamento. Muitos não podem ser copiados legalmente, e os usuários não podem atualizá-los ou utilizá-los para criar seus próprios cursos. Não são, portanto, REA.
REA, conforme mencionado acima, precisam estar disponíveis com uma licença aberta que permita o uso/reuso e modificação legal.
Desafios para integração de práticas REA
Já foi observado que conhecimento sobre os REA se disseminou mais rápido que sua implementação. Obstáculos ainda existem para a integração dos REA pela comunidade educacional global. A Declaração REA de Paris sinalizou esses obstáculos e os demarcou como uma meta para a cooperação internacional. Mesmo se tenha avançado em cada área, novas ações são necessárias pela comunidade internacional. Esses obstáculos são: (1) a capacidade de usuários para acessar, reutilizar e compartilhar REA; (2) questões relativas ao idioma e a cultura; (3) garantir acesso inclusivo e equitativo a REA de qualidade; (4) a necessidade de repensar modelos de negócio; e (5) o desenvolvimento de um ambiente político favorável.
(1) Capacidade de usuários para acessar, reutilizar e compartilhar REA
[Declaração REA de Paris 2012; a, d, e, f, i]
Formação para atores do setor educacional
Para fazer uso proveitoso dos REA é preciso haver líderes flexíveis, abertos a novas ideias, e com vontade para tomar decisões. Portanto, há necessidade de formação para que as lideranças possam garantir que o processo de aproveitamento de REA aconteça tanto de cima para baixo como de baixo para cima. Isso inclui ações de formação para atores do sistema educacional (legisladores, educadores, alunos) para que possam compartilhar material criado com licenças livres e o desenvolvimento de ferramentas amigáveis que possam facilitar a busca, acesso e compartilhamento de REA específicos e relevantes à demandas pontuais.
Desenvolvimento de competências para o uso, reuso e compartilhamento de REA
O desenvolvimento de competências requer que formação continuada relevante esteja disponível para que educadores adquiram as habilidades e competências necessárias para usar REA. Educadores também precisam desenvolver competências de alfabetização midiática e digital para encontrar, compartilhar, criar e remixar REA com eficácia. Outras habilidades incluem: (i) a identificação de “valor” no trabalho de terceiros e conceber o uso desses recursos em outros contextos, (ii) competência técnica para fazer alterações em REA, (iii) competência para tradução e (iv) a capacidade de distribuir e compartilhar novas versões de REA para alunos e a comunidade aberta. O diretório do COL sobre REA (http://doer.col.org) é um espaço detalhado sobre REA no Commonwealth.
Há também necessidade de enfoque em questões de propriedade intelectual, e de desenvolver um bom entendimento sobre licenças livres, suas implicações e como funcionam na prática, particularmente para remixar conteúdos disponíveis com diferentes licenças. É necessário que existam mecanismos para reconhecer o tempo, esforço e habilidades demandadas por equipes educacionais para desenvolver e adaptar REA.
Um outro componente chave é popularizar sistemas de arquivamento e busca para REA (UNESCO, 2016b), o que demanda que sejam simplificados, para que tenham as ferramentas necessárias para desenvolver REA da maneira mais fácil possível. Atualmente, não existem padrões para o acesso, uso e reuso de REA. Para além, as ferramentas existentes para compartilhamento de recursos são limitadas e muitas plataformas disponíveis são de difícil uso.
(2) Questões relacionadas ao idioma e a cultura
[Declaração REA de Paris 2012: g]
Este ponto está relacionado à necessidade de promover o multilinguismo no ciberespaço. A internet, que é o meio principal pelo qual REA são compartilhados, oferece oportunidades para facilitar o intercâmbio livre de ideias através de palavras e imagens. Também apresenta desafios para a garantir a participação de todos, já que a maioria do conteúdo está em inglês. Produzir REA em idiomas locais promove mais diversidade, qualidade e relevância do conteúdo.
Ademais, há necessidade de abordar questões culturais relacionadas às atitudes quanto ao compartilhamento de conteúdo. É importante criar incentivos para encorajar, ou, quando apropriado, demandar o uso de REA em instituições educacionais. Como parte das iniciativas de formação, é importante criar e apoiar comunidades de prática efetivas para fomentar a colaboração e troca de informações. Esse tipo de cooperação tem também como benefício colateral potencial o de melhorar a qualidade (através de revisão, validação de material produzido por terceiros), o aumento do acesso e a redução de custos através do compartilhamento.
(3) Garantindo acesso equitativo e inclusivo a REA de qualidade
Esse ponto está relacionado a dois conceitos: acessibilidade para pessoas com deficiência e o uso de REA em todos os ambientes que envolvam TIC.
Acessibilidade para pessoas com deficiência
Mesmo que REA incluam licenças livres, eles não são necessariamente tecnicamente acessíveis a todos, portanto há necessidade de garantir que questões sobre acessibilidade sejam incorporadas em todos os usos de REA — criação, compartilhamento e/ou remix. Aproximadamente 15% da população mundial, representando um bilhão de pessoas, tem alguma deficiência (World Health Organization, 2013). O número está acelerando em proporção com o crescimento da população, pobreza, desastres naturais, conflitos permanentes e o envelhecimento populacional. Diante do grande número de pessoas vivendo com alguma deficiência, é vital que o acesso à oportunidades educacionais seja abrangente.
[Declaração REA de Paris 2012: a, b, c, d, e]
Acessibilidade para pessoas com deficiência
Mesmo que REA incluam licenças livres, eles não são necessariamente tecnicamente acessíveis a todos, portanto há necessidade de garantir que questões sobre acessibilidade sejam incorporadas em todos os usos de REA — criação, compartilhamento e/ou remix. Aproximadamente 15% da população mundial, representando um bilhão de pessoas, tem alguma deficiência (World Health Organization, 2013). O número está acelerando em proporção com o crescimento da população, pobreza, desastres naturais, conflitos permanentes e o envelhecimento populacional. Diante do grande número de pessoas vivendo com alguma deficiência, é vital que o acesso à oportunidades educacionais seja abrangente.
[Declaração REA de Paris 2012: a, b, c, d, e]
Questões de qualidade
Problemas de qualidade dos REA são um tema comum de debate. Os defensores de REA apontam que a transparência oferecida por REA (sendo que os recursos produzidos por uma equipe são compartilhados abertamente) em geral, coloca uma pressão social nas instituições e educadores para que provem a qualidade do material. Algumas instituições que produzem conteúdo se utilizam da marca ou reputação de instituições para convencer os usuários de que os materiais disponíveis em um sítio é de alta qualidade; se não o são, então o prestígio da instituição corre risco. Outra estratégia utilizada é a revisão por pares, um dos procedimentos de garantia de qualidade mais comumente empregados na academia. Na medida em que um maior número de instituições ao redor do mundo estão, em diferentes níveis, requerendo que educadores compartilhem seus recursos com licenças livres, a experiência claramente demonstra que essa abertura de propriedade intelectual à revisão por pares tem como efeito a melhoria de qualidade do conteúdo de ensino e aprendizagem. Isso acontece tanto porque educadores tendem a investir tempo na melhoria dos materiais antes de compartilhá-los abertamente, como porque o retorno que recebem da revisão de seus pares e dos alunos os auxiliam na melhoria dos recursos.
Está demonstrado que, no desenvolvimento de materiais para o ensino básico e para a formação docente, é útil garantir que mecanismos de controle de qualidade usados para conteúdo não-REA, sejam, quando possível, aplicados aos REA.
[Declaração REA de Paris 2012: a, b, d, e, i]
(4) A necessidade de mudança nos modelos de negócios
[Declaração REA de Paris 2012: j]
Globalmente, o modelo tradicional do mercado editorial têm sido alvo de pressão crescente como consequência do desenvolvimento tecnológico e digitalização de conteúdo. As mudanças vivenciadas pela indústria editorial estão afetando seus paradigmas de mercado e negócios. Princípios básicos, como economia de escala, que eram mantras para esse setor, têm se tornado menos significantes. Livros digitais usualmente são vendidos por preços menores que livros impressos, e na medida em que livros em domínio público crescentemente se encontram disponíveis gratuitamente, os modelos tradicionais do mercado editorial estão cada vez mais ameaçados (Rodrigues, Chimenti, Nogueira, Hupsel, & Repsold, 2014).
A demanda crescente por acesso à educação de qualidade, combinada com os números crescentes de matrículas escolares, demanda maior número de recursos educacionais, particularmente livros didáticos acessíveis. No entanto, o custo de livros didáticos crescem junto com o custo das mensalidades, provocando um aumento no custo total da educação. Na medida em que os custos dos livros didáticos crescem, há uma mudança simultânea em direção a livros didáticos eletrônicos, devido a crescente disponibilidade das TIC. O acesso a livros didáticos eletrônicos acessíveis (de baixo custo), combinado com as possibilidades disponibilizadas pelos REA, oferecem oportunidades para a redução do crescente custo dos livros didáticos, e já existem várias instituições e organizações que criam livros didáticos eletrônicos gratuitos.
Esse desenvolvimento está forçando a indústria editorial a reavaliar seus modelos de negócios e redefinir seus produtos e serviços para que se alinhem a essas novas condições, necessidades e requisitos. Um grande número de governos e instituições — em nível nacional, regional e local — exigem que todos os recursos financiados por impostos ou financiamento público sejam licenciados como REA. Ao mesmo tempo, editoras educacionais e acadêmicas nesses países estão passando por um período de evolução e refletindo a respeito de como será a dinâmica entre publicações tradicionais, com todos os direitos reservados e REA financiados publicamente.
Há necessidade de identificar soluções inovadores para elaborar novos modelos de negócios para que os interesses da comunidade REA e das editoras educacionais sejam atendidos. Diversas possibilidades existem, incluindo: (i) editoras oferecendo serviços educacionais customizados; (ii) editoras concentrando em novos temas onde REA ainda não existem; (iii) editoras criando produtos mistos (por exemplo, produzindo livros didáticos convencionais disponibilizando, ao mesmo tempo, novos produtos como jogos educacionais, com licenças livres); (iv) editoras fazendo a seleção e curadoria de REA; e (v) editoras desenvolvendo modelos híbridos que permitam que tanto REA quanto material com todos os direitos reservados possam co-existir, cada uma atendendo às necessidades de diferentes públicos (UNESCO, 2016b).
(5) Desenvolvimento de contextos políticos favoráveis
[Declaração REA de Paris 2012: c]
A Declaração REA de Paris aponta que recursos educacionais financiados com dinheiro público devem ser disponibilizados com uma licença livre. Isso gera a necessidade de fomento para a criação, adoção e implementação de políticas favoráveis às práticas efetivas em torno de REA. Legisladores e desenvolvedores de políticas institucionais têm papel crucial na promoção de políticas que ajudem a definir o direcionamento de sistemas educacionais. Essas políticas podem acelerar ou impedir a adoção e criação de REA. Muitos países já adotaram políticas para REA e a existência de políticas nacionais pode ser um critério para determinar o nível de comprometimento com REA.
A falta desse marco legal pode limitar e atrasar a adoção ou ainda desencorajar instituições a realizar projetos com REA. Ademais, interesses comerciais, a falta de conhecimento e a falta de líderes fortes podem limitar o desenvolvimento e implementação de políticas favoráveis aos REA. Uma vez que governos e instituições tenham decidido adotar políticas de licenciamento aberto (demandando que os produtos de financiamentos e contratos sejam licenciados abertamente), é também importante providenciar guias e desenvolvimento profissional para a implementação dessa política.
Melhores práticas
A publicação Diretrizes para os REA no Ensino Superior (UNESCO & Commonwealth of Learning, 2011) assinala que o papel dos governos na educação superior, e o relacionamento entre governos e instituições nesse setor variam significativamente de um país para outro. No entanto, governos, no geral, cumprem um papel importante na definição de políticas para os sistemas educacionais. Os governos têm interesse em garantir que investimentos públicos em educação resultem em uma contribuição útil e rentável para o desenvolvimento socioeconômico.
Nesse contexto, governos estão usualmente numa posição para exigir que recursos educacionais úteis desenvolvidos com verbas públicas sejam disponibilizados com licenças livres. Mesmo que existam razões para não requerer licenciamento aberto, o compartilhamento de recursos abertos tem potencial significativo para melhorar a qualidade, transparência e acessibilidade de sistemas educacionais. Ademais, governos podem usar regimes de licenciamento aberto para aumentar o impulso oferecido por investimentos públicos, facilitando o amplo reuso desses recursos com investimento adicional mínimo.
Nesse contexto, a seguinte seção das Diretrizes para os REA no Ensino Superior (UNESCO & Commonwealth of Learning, 2011), p. 5-6) é de grande valor. Se sugere que governos:
- Apoiem o uso dos REA através de seu papel na elaboração de políticas para a educação. Isso inclui encorajar e apoiar o uso dos REA na adaptação de experiências de aprendizagem para um grupo mais diverso de alunos e apoiar programas de inclusão social. Desse modo, será possível encorajar acesso equitativo à educação e melhorar os resultados de aprendizagem para todos os alunos. A sustentabilidade desse esforço pode ser fomentada através de um programa governamental de apoio à criação e reuso de REA.
- Considerem a adoção de marcos de licenciamento aberto. Um modo efetivo para acelerar o licenciamento e compartilhamento de recursos educacionais seria adotar, dentro dos limites da políticas, um marco de licenciamento aberto em nível nacional. Isso pode fazer parte de um marco abrangente sobre propriedade intelectual (PI) e direitos autorais em educação que abarque tanto atividades de pesquisa quanto de ensino. Esse marco de licenciamento poderia também cobrir os direitos autorais e de PI de recursos educacionais produzidos por departamentos e agências de governo.
- Considerem a adoção de padrões abertos. Vinculado ao anterior, pode estar a adoção de padrões abertos. O propósito é garantir acesso pleno e uso/compartilhamento de recursos educacionais. Isso pode englobar tanto publicações educacionais como de pesquisa, garantindo a perpetuidade dos recursos eletrônicos editáveis, independentemente das mudanças em software. Tais normas podem cobrir recursos educacionais produzidos por agências e departamentos de governo e por instituições recebendo apoio governamental para o desenvolvimento de recursos educacionais.
- Contribuam para a conscientização sobre as questões-chave de REA. Isso pode incluir o desenvolvimento e compartilhamento de estudos de caso de boas práticas e exemplos relevantes de uso para apoiar esforços de implementação. Governos podem ajudar os atores do setor educacional a compreender questões relativas a PI bem como os desafios e reestruturação enfrentados por PI devido à rápida digitalização e compartilhamento de informação e recursos online.
- Promovam estratégias nacionais em TIC e conectividade. Dada a centralidade das TIC para o acesso e compartilhamento de conteúdo online, esse apoio pode pode focar na garantia de provisão sustentável de conectividade e acesso às TIC para funcionários/alunos em sistemas educacionais.
- Apoiem o desenvolvimento sustentável e compartilhamento de materiais educacionais de qualidade. Um elemento chave para o desenvolvimento sustentável de REA será o apoio às instituições educacionais, tanto de forma individual como coletiva, em suas iniciativas de produção e compartilhamento de recursos educacionais de alta qualidade. Isso pode incluir o apoio às iniciativas nacionais para o desenvolvimento de conteúdo local, e esforços regionais/globais para o desenvolvimento de repositórios e diretórios de REA, bem como mecanismos de fomento para promover a qualidade em REA.
Não há uma estratégia única que funcionará para todos os contextos mas um enfoque coordenado trará melhores resultados.
Conclusão
REA proporcionam uma oportunidade única para melhoria dos resultados da aprendizagem, redução de custos e aumento da qualidade do ensino, ao permitir um real compartilhamento de recursos. O uso eficiente dos REA em sistemas educacionais, tanto em nível nacional como institucional, garantirá que as oportunidades apresentadas pelo movimento – ainda majoritariamente comunitário e voluntário — em torno dos REA, possam ser aproveitadas de maneira efetiva para operar de maneira central em sistemas educacionais globais. As características inovadoras e menos custosas dos REA podem garantir que se cumpram os objetivos e pilares da ODS 4: educação acessível, equitativa, inclusiva e de qualidade. As consultas regionais para o II Congresso Mundial de REA terão como objetivo explorar estratégias e soluções para enfrentar os desafios da integração dos REA. Com vistas ao compartilhamento de estratégias, podemos aproveitar o verdadeiro potencial transformador dos REA para alcançar a meta de “educação inclusiva, equitativa e de qualidade e aprendizagem ao longo da vida, para todos.”
Referências
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ORS Impact (2015). Evaluation of the William and Flora Hewlett Foundation’s Investment in International Policy Advocacy for Open Educational Resources. Extraído de http://www.hewlett.org/sites/default/files/ORS%20Impact%20OER%20Evaluation%20Report%20CC%20licensed.pdf
Rodrigues, M., Chimenti, P., Nogueira, A., Hupsel, L., & Repsold, A. (2014). From print to screen: Changes and challenges facing the Brazilian publishing industry. Revista de Administração (São Paulo), 49(3), 491–505. Extraído de www.rausp.usp.br/download.asp?file=RAUSP_v49n3_491-505.pdf
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Weller, M. (2011). The digital scholar: How technology is transforming scholarly practice. Bloomsbury Collections. Extraído de http://www.bloomsburyacademic.com/view/DigitalScholar_9781849666275/chapter-ba-9781849666275-chapter-009.xml
World Health Organization. (2013). Disability and health. Fact sheet no. 352. Extraído de www.who.int/mediacentre/factsheets/fs352/en/
Excelentes iniciativas , parabéns !
Há a necessidade de disponibilizar bibliografia (auto estudo) profissionais profissionais da educação ou outros que queiram iniciar seus estudos na área e se aprofundar.
Outra necessidade que tenho e acredito que muitos outros tenham é o acesso a diferentes formatos de REA para utilização em suas aula .
Temos uma boa bibliografia sobre o tema aqui (https://educacaoaberta.org/biblio-rea/).
Em sociedades particularmente desiguais (como as da América Latina), o desenvolvimento de competências para o uso, reuso e compartilhamento de REA tem um papel fundamental. Sem esse esforço, existe o risco de que REA termine por reproduzir (ou até reforçar) desigualdades sociais já existentes. (Sem esse cuidado, uma professora negra de escola em bairro pobre será muito menos beneficiada por REA do que um professor branco de escola em bairro rico — que tipicamente já domina muitos dos conhecimentos necessários para usar e remixar REA; deslocar verbas públicas da educação para REA poderia ampliar esse fosso…)
É importante considerar, por outro lado, que esse esforço não envolve apenas o desenvolvimento de competências técnicas; a baixíssima representação feminina nas comunidades de FLOSS (ainda mais baixa que no setor de software proprietário) mostra que as barreiras a serem transpostas são também culturais e sociais: é preciso fomentar comunidades de REA que sejam inclusivas e acolhedoras.
No caso do Brasil, é importante destacar o potencial transformador (ainda não utilizado) dos programas governamentais de compras de livros didáticos. O governo sustenta uma parcela muito significativa do mercado editorial com as compras que faz por esses programas, e teria um grande poder de barganha para começar a exigir das editoras políticas de licenciamento alinhadas a REA.
Sugestão: Definir o conceito “Aberto”, sem o qual quaisquer tentativas de advogar em favor dos REA terão poucas chances de sucesso, tendo em vista a confusão que o termo gera (por exemplo, o entendimento equivocado de que “Aberto” seja sinônimo de disponibilizado na Internet). A definição deve ser clara e mostrar que aberto não é o que está disponível